domingo, 25 de agosto de 2013


TEOLOGIA DA NOVA ALIANÇA: UMA ANÁLISE           

                             SANTOS JUNIOR, Evandro Carvalho dos  (ECS)[1]



                                                 
                                               1 INTRODUÇÃO

Sabendo da importância que a teologia bíblica possui para determinar o modo de viver de todo cristão, propomos uma análise de uma perspectiva não muito popular, mas extremamente voltada a assuntos relevantes.
A Teologia da Nova Aliança será esboçada nesse ensaio de uma maioria histórica, pois sempre é importante verificar o desenrolar de uma doutrina em tempos passados. Essa análise histórica passeará desde o período patrístico até a maneira moderna estruturada que hoje a Teologia da Nova Aliança possui.
Depois disso, definiremos o que é a Nova Aliança e o seu breve relacionamento com outros sistemas, como a Teologia do Pacto e o Dispensacionalismo; a hermenêutica aliancista, e o seu entendimento em relação às promessas a Israel e a questão escatológica nesse sistema.
Como o tema demanda uma analise exegética bem extensa e complexa, não nos aprofundaremos em expressões mais técnicas ou de extrema complexidade. Pois, acreditamos que uma visão panorâmica desse sistema sempre será útil, seja em que nível for. Porém, por motivos de simplicidade, observaremos a ideia básica da Teologia da Nova Aliança e como ele se relaciona com a Bíblia.

2 A HISTÓRIA DA TEOLOGIA DA NOVA ALIANÇA
A Teologia da Nova Aliança como um sistema completo, tem sua inauguração em anos bem recentes. Porém, suas bases têm sido rastreadas até o período patrístico. Ponderando com extrema cautela o fato de que os pais da igreja não possuíam uma perspectiva moderna de neo-aliacismo, mas algumas afirmativas apenas.
Assim, Irineu (d.C.130-202) demostrava um extremo contraste entre a Antiga Aliança e a Nova (uma característica bem peculiar do neo-aliacismo) provando a superioridade desta ultima, como inaugurada por Cristo:
Alpha
Jesus quer dizer com essas coisas que são trazidas do tesouro novo e do velho, duas alianças, a velha, que foi a lei dada anteriormente, e, aponta como nova, dessa forma fora de vida exigida pelo Evangelho. ...E Jeremias diz:"Eis que farei uma nova aliança, não como eu fiz com seus pais" no Monte Horebe. Mas um só e o mesmo o dono da casa produziu ambas as alianças, a Palavra de Deus, nosso Senhor Jesus Cristo, que falou com Abraão e Moisés, e que restituiu-nos de novo à liberdade.... (Irenaeus apud WELLS; ZASPEL, 2002, p.p 23,24)2

Nessa declaração, Irineu demostra a superioridade da Nova Aliança em relação a aliança mosaica e abraâmica, insistindo que essa transição ocorreu mediante o sacrifício de Cristo. Todavia, isso não anularia o plano da redenção divina, pois, tanto a antiga aliança quanto a nova foram instituídas por Deus, “o dono da casa”.
Quando o neo-aliancismo percebeu esse claro contraste que os pais da igreja faziam entre Antiga e Nova Aliança, observaram que a Antiga na maioria das vezes mencionadas pela bíblia referia-se a Aliança mosaica, o pacto da lei.
Justino Mártir asseverou que os cristãos:

[...] não confiam por meio de Moisés ou através da lei... Agora, a lei colocado contra a lei revogou o que está antes dele, e uma aliança que veio depois de uma maneira que pôs fim a anterior, e uma lei eterna e final , ou seja, por Cristo foi dada a nós, e o pacto é de confiança, depois dessa não haverá mais nenhuma lei,  mandamento e ordenança." (apud PETTEGREW ,2007,p.193).

Com isso, ele deixou claro que base para o comportamento e a confiança do crente na Nova Aliança repousa em uma lei que Cristo entregou; não uma repetição do que fora dito antes, mas uma nova lei.
Orígenes (d.C.185-254) também manteve essa ênfase em duas alianças distintas, uma com a igreja (a nova aliança) e outra com Moisés, comentando Efésios 2.12 afirmava que os gentios eram “estranhos as  alianças de Deus dada por Moisés e por Jesus, nosso Salvador, e que não tinham parte nas promessas que Ele fez por eles [..]” e, então, não seria apenas uma questão de ênfase ou abrangência de uma só aliança, mas porque “Ao dizer isso, ele parece limitar as alianças [...] (apud WELLS; ZASPEL, 2002, p. 25). Essa dicotomia é fundamental para a Teologia da Nova Aliança, é sobre ela que a perspectiva se sustenta ou rui.
Contudo, a ideia de continuidade da lei/decálogo mosaico permaneceu vigente na idade média através de Tomás de Aquino (d.C.1227-1274) que influenciou o pensamento medieval através da sua Suma Teológica. Assim, Ele observava que segundo a passagem de Hebreus 1.1-2, aquela revelação dada por Deus “[...] prova a excelência da Nova Lei sobre a Antiga; porque no Novo Testamento Deus falou-nos pelo Seu Filho, enquanto que no Antigo Testamento a palavra foi falada por anjos (ii.2)”(apud WELLS; ZASPEL, 2002, p. 25). Isso é apresentado como uma e a mesma substância (lei?) asseverada em ambos os Testamentos com uma diferença, apenas, de mensageiros. No Antigo Testamento essa lei foi exposta por meios diferentes daqueles da Nova Aliança, mas permanece a mesma mensagem, sem descontinuidade.
Mais adiante, durante o período da Reforma Protestante, algumas características do neo-aliancismo foram encontradas nas afirmações do Anabatismo. Essas peculiaridades na Reforma Radical mantinham elementos de uma “Nova Lei”, estava em oposição a lei de Moisés, asseverando que o Novo Testamento possuía autoridade hermenêutica sobre todo o Antigo Testamento.
Algo ainda muito comum nesse grupo era a sua tipologia bem semelhante ao neo-aliancismo moderno. Como bem expressou o anabatista Hans Betz martirizado em (1537):
Cristo nos mostra a lei de Deus para o homem: "Faça aos outros o que gostaria que fizessem com você. "Ele nos mostra o que é bom e o que é ruim para que possamos viver de uma maneira diferente. Cristo é o cumprimento da lei que foi dada em figuras a Moisés. Todos as figuras da  lei finalizam em Cristo, porque Cristo é a lei. [sic] pois obedecer a lei, diz Cristo, é amar a Deus com toda a força da nossa almas, e amar o nosso próximo como a nós mesmos. Nestes breves mandamentos a lei é recolhida em Cristo (apud HOOVER, 2008, p. 107).

Essa era uma declaração típica de um anabatista do séc. XVI, os radicais, como eram conhecidos, enfatizavam a ética do amor, pois a “Fé e amor de um coração puro, diz Paulo, é a soma de todos mandamentos [...] e, “é assim que a lei e os profetas são cumpridos em Cristo, nosso Senhor. Esta é a maneira que ele tem nos mostrado que conduz ao Pai e a vida eterna [...]”(BETZ apud HOOVER, 2008, pp. 107,108).
No período pós-reforma, a Teologia da Nova Aliança foi identificada “especialmente entre os puritanos, como John Bunyan”(FERREIRA;MYATT, 2007,p.1155). Muitas expressões de Bunyan apontavam para uma visão de lei bem parecida com o neo-aliancismo. Um exemplo claro estava em seus escritos que revelavam fortes críticas a observância do quarto mandamento:

[...] e se Deus nunca ordenou que este sábado fosse santificado  por sua igreja: e, como já disse antes, se estas cerimônias foram longas uma vez que  morta e enterrada, como deve este sábado ser mantido?    Que os homens observem-no, para que  enquanto eles pleiteiam pela   lei, finjam  ser os únicos que cumprem   a vontade de Deus, para que fazendo assim eles não sejam achados como os maiores transgressores da mesma. E por que eles não podem manter os outro sábados? Como o sábados de meses, de anos, e o jubileu?   Pois isso, como eu já apresentei, não é nenhum preceito moral, é apenas um ramo do ministério da morte e condenação.( BUNYAN, 1685, pp.13,14)

Essa proposição feita por Bunyan trazia uma conotação de lei de Cristo bem semelhante àquelas que seriam posteriormente afirmadas pelos adeptos da Teologia da Nova Aliança.  Contudo, a expressão maior do pensamento puritano nesse período era a Teologia do Pacto, pois a forte influência da Confissão de Fé de Westminster (e suas variações entre congregacionais e batistas) não permitia que a lei de Moisés/decálogo fosse examinada de maneira diferente do que o pensamento predominante confessava.
Após algum tempo de exames e polêmicas (as mais variadas possíveis!), a questão da lei, alianças, Israel e Igreja continuou sendo discutida, o assunto ganhou mais abrangência entre o meio batista calvinista, pois tanto a Teologia do Pacto quanto o neo-aliancismo expressam sua soteriologia tipicamente calvinista, e em relação a essa última, o pensamento batista é predominante.
Com o crescimento da teologia reformada em meios batistas, descobriram-se também fortes tendências do neo-aliancismo na “Confissão de Fé Batista de 1644, afirmada atualmente por muitas igrejas que seguem a Teologia da Nova Aliança” (FERREIRA; MYATT, 2007, p. 1111). Como essa confissão foi revisada e adaptada posteriormente, se tornou a Confissão de Fé Batista de 1689, uma adaptação da Confissão de Fé de Westminster com forte ênfase na Teologia do Pacto.
Nessa peregrinação hermenêutica, a busca exegética por uma perspectiva  bíblica no cenário histórico-redentivo da humanidade, precisava ser definida em termos de equilíbrio entre o Dispensacionalismo e suas nuanças descontinuidade, e, a Teologia da Aliança com seus traços de continuidade.
Portanto, em longa pesquisa e interesse sincero por uma teologia bíblica que reconheça a dificuldade exigida pelo assunto, a Teologia da Nova Aliança tem sua estrutura já formada e “Atualmente, seus principais representantes incluem John Reisinger, Tom Wells, Fred Zaspel e Geoff Volker, atraindo a atenção de eruditos como D. A. Carson, John Armstrong e Douglas Moo”( FERREIRA; MYATT, 2007, p. 1112).
Hoje, a Teologia da Nova Aliança é ainda bem desconhecida em comparação ao Aliancismo e o Dispensacionalismo, contudo, tem investido muito nas mídias sociais/sites; em uma editora própria, como a New Covenant Media; e em conferências anuais, como a John Bunyan Conference.
Com esse pano de fundo histórico bem extenso, a Teologia da Nova Aliança mostra-se promissora em seu futuro, tanto pelos seus adeptos e simpatizantes, como pela sua proposta e rápida expansão. Nesses passos largos que essa perspectiva vem tomando, não demorará muito para que se torne possivelmente uma teologia bem aceita e bastante popular nos próximos anos.


3. A DEFINIÇÃO DE NOVA ALIANÇA
Muita controvérsia tem sido levanta quando se trata de definir o que é a Nova Aliança, portanto, a conceituação realizada será determinante, também, para definir outros assuntos, como: batismo, igreja composta por regenerados somente etc.
Por isso, a tônica da Nova Aliança é o tema central para esse sistema, pois ao estabelecer a promessa de Jeremias 31.31-34, é logo percebido que não pode ser algo apenas apontando para um fim milenar. Assim, os teólogos neo-aliancistas observam que essa Nova aliança já está em plena operação através da obra de Cristo. O que faz essa Aliança ser altamente cristocêntrica, não apenas como uma administração diferente, mas uma Aliança completamente Nova, em substancia e administração na história da salvação.
Um conceito bem estruturado e simples foi afirmado por Wells:
A Nova Aliança é o vínculo entre Deus e o Homem estabelecida pela morte sacrificial de Jesus Cristo, sob o qual todos os que foram eficazmente chamados por Deus em todas os tempos formam no único corpo de Cristo nos tempos do NT, a fim de estar sob sua lei durante esta era e permanecer debaixo da sua autoridade para sempre. (WELLS; ZASPEL, 2002, p. 75,76)

Essa declaração mostra a cumplicidade da Nova Aliança que Deus estabeleceu com o verdadeiro crente, e as exigências que Ele coloca como lei nesse Novo Pacto. Logo, se esse único corpo foi formado por Cristo a partir do Novo Testamento, então, a igreja é uma novidade nesse plano histórico-redentivo.
A Nova Aliança foi uma promessa àquele povo vetero-testamentário, isso, incluía alguns elementos próprios dessa nova era, como por exemplo, “ um novo coração (Ez 11: 19-20); permanente perdão dos pecados (Jr.33:8); a perene habitação do Espirito Santo em todos os crentes (Ez.36:27) [...]”(PETTEGREW ,2007,p.185), e, isso faz o neo-aliancismo rejeitar toda ideia de batismo infantil e enfatizar a igreja composta apenas por regenerados.
Por outro lado, a antiga aliança é exposta como expirando no surgimento da  Nova Aliança, ambas não andariam juntas em substância, mas, uma substituiria a outra e faria que a anterior se tornasse antiquada (Hb 8.6-13). A Antiga Aliança, essencialmente ligada a lei mosaica, “era o pacto divino estabelecido exclusivamente com a nação de Israel. Os termos dessa aliança eram os “dez mandamentos” ou “tábuas de pedra”( VOLKER; KNAUB; ADAMS, p.2).
Dessa maneira, fica claro que a Nova Aliança contrasta agudamente essa expressão judaico-sinaítica aos crentes da nossa era. De uma maneira negativa, a Nova Aliança é a Negação daquela Aliança Mosaica, tanto relacionada à lei, como na forma e na pessoa que a faz ser completamente superior a antiga.

4. LEI MOSAICA OU LEI DE CRISTO ?
As demandas da Antiga Aliança eram exigências à observância da lei, dadas àquele povo no Sinai. Todo pecado contra Deus, naquela dispensação, era uma quebra do Pacto sinaítico (Ex.20.1-26).
Essa lei foi dada “por causa da transgressão até que viesse o descendente a quem se fez a promessa” (Gl 3.18,19), por isso, essa lei expressava-se com um caráter extremamente temporário.
No Antigo Testamento essa demanda legal estava vinculada a elementos civis/religiosos/morais, não como uma necessidade de serem distinguidos assim, mas, porque sua aplicação e entrega era holística e inseparável àquela nação (Ex. 20-23).
Portanto, quando Deus entregou leis a nação de Israel, Ele aplicou naquela lei elementos de Sua própria moralidade, aliás, uma lei intrínseca ao caráter do próprio Deus era uma realidade latente naquelas exigências pactuais. Por conseguinte, a lei mosaica não foi essencialmente a lei de Deus, mas apenas continha fragmentos desta. Por norma divina (lei eterna), queremos dizer que:

Lei moral é a que tem sua origem no caráter moral imutável de Deus com o resultado que é intrinsecamente certo e, portanto, liga todos os homens de todos os tempos e todas as terras a quem se trata. (WELLS; ZASPEL, 2002, p. 162)

  Esse era o motivo que trazia punição para aqueles que a violassem, porque, embora a sua aplicabilidade trouxesse luz a questões meramente temporais realmente, contudo, ela não era completamente temporária. Havia elementos do caráter moral de Deus ali presentes, e, em sua quebra a esses termos contratuais (a lei), deveriam estar cientes que não estavam rompendo apenas com estatutos civis, mas com a revelação moral de Deus.
Ao longo do progresso da revelação divina, vemos a profecia de Jeremias acerca de uma Torá escrita no coração do povo de Iaveh (Jr 31.33). Logo, essa lei era uma dádiva ao povo da Nova aliança (v.31).
Como tal, essa norma deveria ser continuada em alguns termos conforme a anterior, porem expressaria o advento de uma Aliança que suplantaria a anterior, pois Deus disse que era “não conforme a aliança que fiz com seus pais”(v.32), indicando assim uma descontinuidade aliancística, um rompimento. A Antiga Aliança tinha seus termos contratuais (por ex. a lei mosaica), e a Nova Aliança autenticará a sua validade mediante seus próprios contratos (uma nova lei).   
O ministério de Cristo na terra foi eficaz em toda a sua obra e ética, seus ensinamentos foram bem mais excelentes, e reveladores, “assim como também a aliança da qual ele é mediador é superior à antiga, sendo baseada em promessas superiores” (Hb 8.6), logo, sua lei como uma parte pactual dessa nova era, também deveria ser superior a antiga.
O desenvolvimento dessa nova ética (lei) se tornou tão latente no Novo Testamento que Paulo, após escrever sobre a escravidão da lei, através de uma alegoria (Gl. 4. 1-31), começou a falar da liberdade dessa lei que tornava-o escravo (4.31-5.1),  e, explicou como aconteceu a substituição dessa lei de escravidão (Agar/Antiga Aliança/Lei mosaica). Depois disso, chegou até mesmo a exortar aqueles cristãos a cumprirem a Lei de Cristo (6.2).
Portanto, a Nova Aliança demanda um novo código de conduta. Esse novo código (lei), não é apenas uma reedição daquele entregue no Sinai, mas algo que foi trazido mediante o sacerdócio de Cristo, porquanto o sacerdócio de Arão e Melquisedeque teve o seu papel apenas de maneira transitória, mas “Certo é que, quando há mudança de sacerdócio, é necessário que haja mudança de lei” (Hb 7.11,12).
Agora, se a lei mosaica não estabelece mais obrigatoriedade a um crente da Nova Aliança, isso significará que ele é antinomiano? Porque se for essa a conclusão do pensamento paulino, então não significaria isso uma progressão ética, mas uma moralidade subjetiva e perigosa. E, quanto as advertências contra a imoralidade sexual, a adoração a ídolos, assassinato etc., ficará sem obrigatoriedade para um cristão? Não seria melhor fazer como os gálatas e sugerir um retorno a Agar/Antiga Aliança?
Esse é o ponto crucial na lei da Nova Aliança, pois, a superioridade ética também diz respeito a essa nova era. O padrão para o crente da Nova Aliança é bem mais exigente do que a anterior, a qual punia e culpava o infrator que transgredia visivelmente aquele preceito. Porem, agora, não somente os atos, mas as próprias intenções do coração são colocadas sob julgamento (Mt.5.22,28;1 Jo 3.15).
 Os ensinamentos e a pessoa de Cristo formam o mais alto padrão de ética, porque se alguma objeção de viver sem lei (mosaica) fosse levantada contra Paulo, ele mesmo respondia que não era como alguém que permanecia “estando sem lei para com Deus, mas debaixo da lei de Cristo” (1 Co 9.21).
Outra observação se faz necessária. Também é importante analisar a seriedade da acusação que é feita àqueles que aderem as implicações do ensino bíblico da Nova Aliança, pois esse são chamados de antinomianos, o que é incorreto,  pois “ a posição esboçada aqui mantem que os Cristãos não estão debaixo da Lei Mosaica, não que eles estão livres de toda lei” (MOO in FEINBERG, 1988, p.218). Dessa maneira, percebemos que o problema é afirmar que se alguém não segue a lei de Moisés, não segue lei nenhuma.
           

4. A HERMENEUTICA NEO-ALIANCISTA
Outro fator muito importante na Teologia da Nova Aliança é a sua hermenêutica, pois, nesse ponto, ela se identifica muito com o aliancismo. 
A sua maneira de relacionar ambos os testamentos, tem como método, o Novo Testamento interpretando o Antigo, quer seja em cumprimento de promessas e profecias, na tipologia etc., isso torna esse sistema bem cristocêntrico em sua teologia bíblica.
Para a Teologia da Nova Aliança, Cristo é o cerne de toda a revelação bíblica comunicando-Se de maneira mais clara nos escritos do Novo Testamento. Porem, esse aspecto interpretativo só se torna mais evidente quando são avaliadas algumas nuanças do aspecto profético nas escrituras.

4.1 A nação de Israel e a Nova Aliança
Como o povo de Israel recebeu várias promessas de restauração, Deus deveria cumprir de maneira fiel aquilo que prometeu, porem para a Teologia da Nova Aliança, isso é descrito em termos de remanescentes no Novo Testamento (Rm.11.5).  
Para a Teologia da Nova Aliança, a nação de Israel era o povo incrédulo de Deus na antiga Antiga Aliança, e a sua função naquela revelação anterior, era de servir como figura para o verdadeiro povo de Deus, ainda que entre eles houvesse remanescentes.
Dessa maneira, a Teologia da Nova Aliança se afasta tanto do dispensacionalismo clássico, que espera o cumprimento da Aliança Davidica e Abraamica em seu aspecto acentuadamente escatológico. Pois, teólogos neo-aliancistas, não acham razoável a repetição de cumprimento dessas alianças, porque tanto a epístola aos Hebreus quanto a de Gálatas mostrou a transitoriedade daquelas alianças, daquela antiga lei que regulamentava aquele povo.
Então, se o cumprimento da Nova Aliança acontece de modo cabal em Cristo e sua Igreja e “Tais são as bênçãos do novo pacto”, logo, seria necessário que o elemento da qual a figura apontava, expressa-se uma realidade eterna e superior (definitiva). Pois, aquela figura deveria ser vista como própria de sua função, ou seja, que  " Os tipos e as promessas da antiga aliança foram todas preenchidas em e por Cristo. A nova era raiou. Por que voltar para as sombras?”(Randal).
Por outro lado, a Teologia da Nova Aliança não sustenta a ideia de que a igreja já existia no Antigo Testamento, ainda que existissem eleitos dentro da nação israelita. Assim, todas aquelas promessas de expansão e promessa de uma Terra para Israel  (Gn 15.4,5), são interpretadas à luz de seu próprio cumprimento  na chegada a terra de Canaã (Sl. 105.4-11).

Se lêssemos apenas essas passagens, sem uma revelação complementar (o Novo Testamento), não haveria progressão no aspecto de seu cumprimento e aquela promessa indicaria somente um caráter físico e genealógico. Contudo, em Romanos 9.6-8, Paulo mostra que essa descendência é aquela que está ligada a Abraão pela fé, os filhos da Promessa.  A mesma ênfase no caráter transcendente da Promessa Abraâmica é abordada novamente em Gálatas, no qual é dito que o descendente a quem foi feito a promessa é Cristo (3.16), e também, a todos que estão unidos a Ele também são descendência de Abraão e herdeiros segundo a promessa (v.19).
Por isso, “Os israelitas na era da Nova Aliança foram removidos como povo de Deus porque a aliança estabelecida com eles, a Antiga Aliança, chegou ao fim”[...], conforme é relatado em Hebreus 8.6-8, inaugurada pela obra de Cristo, o qual trouxe uma Nova Aliança, uma nova lei e um novo povo. Pois,  “O povo de Deus, que cumpre a promessa feita a Abraão, é constituído por quem foi salvo pela obra de Jesus Cristo na cruz — a Nova Aliança”(VOLKER, p.3).
Com esse pano de fundo em mente, é necessário deixar claro que, agora, para israelitas receberem os privilégios da Nova Aliança, eles têm que serem incluídos na igreja  formada por judeus e gentios (Ef.2.14-18).  

4.2 A Teologia da Nova Aliança e a escatologia
No que se refere a escatologia, as posições dos adeptos da Teologia da Nova Aliança são bastante diversificadas. Porém, um consenso entre eles é a negação de um arrebatamento pré-tribulacional, pois esse conceito estaria carregado de uma série de pressupostos do dispensacionalismo clássico.
Assim, como o seu tratamento de profecias vetero-testamentárias são aquelas que se referem no cumprimento da igreja, logo, torna-se comum entre esses teólogos o Amilenismo.
Por sua escatologia do Novo Testamento ser bastante simplificada, o mais longe que a Teologia da Nova Aliança pode  desenvolver em termo de um sistema escatológico que reconheça algum privilegio futuro para Israel, é o Pré-milenismo histórico. Isso não significa que haverá uma primazia do reinado israelita naquele período, e isso serve para esclarecer muitas coisas, pois, é importante deixar bem definido que a Teologia da Nova Aliança:

[...] não é a teologia da substituição, se com isso você quer dizer que Deus substituiu as primeiras pessoas verdadeiras de Deus pelo povo de Deus número dois. Mas NCT é uma teologia da substituição, se com isso você quer dizer que o foco da atenção de Deus não é mais em uma determinada nação (Israel), mas sim a preocupação de Deus é com [...] o verdadeiro povo de Deus, que é composto de judeus e gentios. (LEHRER apud MAYHUE, 2007, p.224)

Por isso, sua interpretação escatológica está sempre voltada para a primazia de Cristo sobre a igreja, os judeus seriam uma grande inclusão durante o período do milênio, no qual Deus realizaria a promessa de Romanos 11. No entanto, o Pós-milenismo também é possível nesse sistema escatológico, tanto pela profecia cumprida já na igreja, quanto na conversão de judeus esperada pelos pós-milenistas que marcará o grande avanço no evangelho de Cristo por toda a terra.

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Depois de analisar nos moldes históricos e teológicos da Teologia da Nova Aliança, percebemos que a sua preocupação é bem pastoral também. Pois, investindo numa teologia que produza uma forte ênfase  em uma igreja de convertidos apenas, o neo-aliancismo exorta ao teólogo de erudição que mantenha sua perspectiva da maneira mais coerente com a vida sua congregação.
È algo notório que essa perspectiva aliancistica de uma nova lei, foi muito explorada no calor da perseguição anabatista. Com toda a passividade que o Novo Testamento exige, esses crentes mantinham sua sua vida em comunidade com bastante simplicidade e reflexão nessas verdades. O que é algo bem incomum em nosso tempo, pois a teologia geralmente é “fabricada” em grandes instituições acadêmicas, mas não trazem sangue na verdade que foi defendida, apenas o crescimento encefálico e soberbo é o que se torna visível nesse academicismo hodierno.
Outro fator bem importante para uma boa teologia bíblia é a definição que a lei possui para os crentes. É bastante confuso a compreensão de norma divina que é imprimida na mente dos cristãos hoje, algo extremamente subjetivo, uma emoção como o critério do certo e/ou errado. Isso é muito perigoso, pois um tema extremamente sério com esse, não pode ser tratado de maneira tão simplista, muitas vezes até negligenciado.
A análise é necessária para se definir qual será a norma para o cristão viver de maneira bíblica e santificada, negligenciar isso, é abrir mão do tesouro de mandamentos deleitosos que existe em toda a Bíblia.
Por conseguinte, a escatologia será apenas  uma consequência obvia do padrão hermenêutico utilizado em toda a interpretação de lei, dispensação, aliança Igreja/ Israel etc., essa deve flui da chave hermenêutica, não ser esquematizada primeiramente para depois se feito outros ajustes.  Por outro lado, não seria prudente negligenciar o estudo da doutrina das ultimas coisas, porque ela é determinante para a esperança que o cristão alimentará enquanto a história humana se desenrola.
Considerando a abrangência que o assunto exige, sabemos que o tema não se esgotará nos próximos anos. E oxalá que continue dessa forma, pois a profundidade da lei de Deus e do Seu relacionamento com o homem só pode gerar doutrinas profundas demais para se precisar com toda competência o que ela significaria de modo pleno. Contudo, a reflexão trará firmeza nas convicções de alguém sobre o tema, ou até mesmo uma variação dentro dos limites bíblicos.











REFERÊNCIAS:

1.WELLS, Tom; ZASPEL, Fred G. New Covenant Theology: Description, Definition, Defense. Frederick, Md.: New Covenant Media, 2002. (Tradução minha)

2.HOOVER, Peter; The Secret of the Strength: What Would the Anabaptists Tell This Generation?. Disponível em:. <http://www.elcristianismoprimitivo.com/pdf/the-secret-of-the-strength-.pdf> Acesso em: 07 junho 2012. (Tradução minha)

3. BUNYAN, John. Questions About the Nature and Perpetuity of the Seventh-Day Sabbath. Disponível em:. <http://www.chapellibrary.org/johnbunyan/text/bun-sabbath.pdf> Acesso em: 12 junho 2012. (Tradução minha)

4. VOLKER, Geoff; KNAUB, Bill; ADAMS, Mike. Que é Teologia da Nova Aliança?. Disponível em: <www.ids.org/pdf/portuguese/wnct.doc> Acesso em: 13 junho 2012.  (Tradução minha) 

5. VOLKER, Geoff. Israel na Teologia da Nova Aliança. Disponível em<www.ids.org/pdf/portuguese/israel.pdf> Acesso em: 13 junho 2012. (Tradução minha)


6. PETTEGREW, Larry D.  The New Covenant and New Covenant Theology. TMSJ, 18/1, p.181-199, 2007.   (Tradução minha)

7. FEINBERG, John S. Continuity and Descontinuity: Perspectives on the Relationship Between the Old and New Testaments 1ª edição. Wheaton, Illinois: Crossway Books, 1988. (Tradução minha)

8.FERREIRA, Franklin; MYATT, Alan. Teologia Sistemática: Uma análise histórica, bíblica e apologética para o contexto atual. 1ª edição. São Paulo: Edições Vida Nova, 2007.

8. MAYHUE, Richard L. New Covenant Theology and Futuristic Premillennialism. TMSJ, 18/1, p.221-232, 2007.  (Tradução minha)





[1] Bacharelando em Teologia na Escola Teológica Charles Spurgeon.
                                                                                                                                                                             
        

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